Música é conexão com a natureza e a saúde mental
O músico americanense Roger Marza conta um pouco de seu processo criativo e dos trabalhos que estão em curso
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Os números das métricas das músicas que toco são muito modestos. Desde que lancei meu último single “Praia do Sancho”, no dia 25 de março, em parceria com o cientista Raul Rio Ribeiro, coordenador da ONG Ocean Sound, o Spotify informa que a música foi tocada 57 vezes por 41 ouvintes. E somando com meus álbuns “Alma da Terra” e “Maritacas Flow”, lançados em 2021, eu tenho 185 ouvintes que escutaram as improvisações livres com sons da natureza e da ciência 996 vezes, ou 996 streams. A música mais ouvida é “So Whale”, improvisação livre ao som de baleias azul e cachalotes, com 131 streams, segundo dados coletados até 15 de abril de 2022.

Investi pouco dinheiro para gravar, lançar e divulgar nas redes sociais essas músicas todas. Exceto “Praia do Sancho”, que gravei no estúdio do Instituto Damata, as outras músicas que lancei eu gravei em casa mesmo, em estúdio improvisado no guarda-roupa, usando os gravadores de dois telefones celulares, além de apoio de cientistas que me forneceram paisagens sonoras, como o Laboratório de Acústica e Meio Ambiente da USP, pelo professor Linilson Padovese, a Ocean Sound, o Observatório Alma no Chile e até o rover da Nasa que está em Marte. Mas gravei muito som de passarinho, cigarra e água usando meu celular mesmo, no prédio onde eu moro e no Parque Villa-Lobos, em São Paulo, e até no bairro São Pedro, em Americana.

TERAPÊUTICO

Apesar de não investir na promoção de posts em redes sociais, apostei na minha capacidade de jornalista em escrever e me comunicar com os companheiros jornalistas em diversos veículos de comunicação, conquistando diversas reportagens sobre os lançamentos. A comparação das minhas métricas com outros artistas me deixaria desanimado se estivesse fazendo música pensando em números. A música tem para mim um efeito terapêutico, que comecei a exercitar com mais profundidade por volta de 2014, dez anos após iniciar o estudo do saxofone.

Em 2011, tive uma doença mental grave, ao ponto de um médico sugerir a minha internação, o que ainda bem não se concretizou. Eu fiquei sem trabalhar por seis meses, completamente desorientado, embora até hoje eu lembre de absolutamente tudo que senti e vivi naqueles terríveis dias. Tive o acompanhamento de um psiquiatra muito querido, que me atende até hoje. E mesmo durante esses dias turbulentos, eu fazia meus exercícios ao saxofone e comecei a desenhar rabiscos, um deles foi a capa do álbum “Maritacas Flow”. E por volta de 2015, conheci o projeto Tambores Flow, da meditadora Mônica Jurado, que une percussão de tambores xamânicos com mantras e meditações. E comecei a participar de várias reuniões levando o saxofone, que me ajudou muito em todos os sentidos.

Em primeiro lugar, a meditação acalma a mente e me inspirava em formas de tocar durante os chamados “meditashows”. Por volta dessa época, comecei a estudar saxofone com o multi-instrumentista Mario Aphonso III, um verdadeiro mestre da música brasileira e da música oriental, que lidera o coletivo Tarab. Foi uma experiência incrível e inspiradora viver junto à família dele por tanto tempo. E, quem sabe em breve, voltarei a estudar com ele maqams árabes, que se assemelham às escalas, com a diferença que transmitem estados da alma de uma forma mais profunda que as escalas ocidentais. A música também me levou para a Umbanda, uma religião belíssima, que me faz muito bem em meu processo de cura. E, também, influenciou muito meu processo artístico e criativo.

ANTIGO SONHO

Com os álbuns que lancei realizei um antigo sonho de tocar em aula de yoga. Primeiro, nas aulas de Daniel Braga Lima no Centro de Apoio ao Deficiente Visual (Cadevi), em São Paulo; depois no projeto Yoga com Música Natureza Sonora, que toquei em aula de yoga da professora Tânia Gomes, no Sesc Piracicaba. Acompanhei Daniel em roda de mantra do retiro Desperte e Manifeste, da terapeuta Mayara Souza, no Ashram Serra da Cantareira.

Realizei dois shows online Natureza Sonora, com paisagens sonoras dos meus álbuns. E ainda vou lançar um álbum com paisagens sonoras de Fernando de Noronha, ao menos esse é o projeto. E uma improvisação minha ao som dos atabaques de Daniel na música “Sabedoria de Oxum”, feita em homenagem ao livro “Português Pluricêntrico e Apredizagem Global”, de Vanessa Domingues, foi apresentada no dia do lançamento da obra na Embaixada do Brasil em Berlim, no dia 6 de abril. Ainda vamos lançar essa música em streaming, por enquanto ela está na Rádio Marza, meu canal no YouTube, em vídeo com arte e edição do artista Gilson Domingues.

E vou criando sons, sozinho ou com os amigos, porque é uma forma de dizer, sem palavras, o que sinto do mundo, caótico e muitas vezes cruel, ora buscando curar feridas, ora expurgando minha perplexidade diante de tanto horror. Mas sempre com fé de que dias melhores virão. As métricas não contam o bem que me faz tocar. E que esse bem chegue até você, seja pelo som que faço ou pelas alegrias das coisas simples da vida.

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