Projeto cultural promove arte e acolhimento em oficinas para mulheres
Projeto Kintsugi, conduzido junto a mulheres atendidas na Unacon, ensina que que as cicatrizes não precisam ser apagadas e podem ser fonte de força e beleza
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O projeto "Kintsugi", realizado pela Prefeitura de Americana, por meio da Secretaria de Cultura e Turismo, e Governo Federal, por meio do Ministério da Cultura, fez sua estreia neste mês de maio na Biblioteca Municipal "Professora Jandyra Basseto Pântano", no Centro, oferecendo oficinas de arte para mulheres em tratamento oncológico, atendidas na Unacon (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia) de Americana.

Inspirado na filosofia japonesa que valoriza as cicatrizes como parte da história e da beleza de um objeto, o projeto Kintsugi tem o objetivo de promover a autovalorização e a resiliência feminina por meio da arte e da partilha de vivências. As atividades serão quinzenais, sempre às segundas-feiras, até o dia 16 de setembro.

Idealizado e coordenado pela artista Pietra Borges, o projeto é voltado exclusivamente para mulheres e propõe a reconstrução simbólica das trajetórias pessoais por meio de oficinas criativas com técnicas de aquarela em lenços, autorretratos fotográficos e a filosofia do Kintsugi, que consiste em reparar cerâmicas quebradas com pó de ouro, exaltando suas rachaduras em vez de escondê-las. A iniciativa tem parceria do Unacon para sua realização.

 

CICATRIZES
"O Kintsugi nos ensina que as cicatrizes não precisam ser apagadas. Pelo contrário, elas contam a nossa história e podem ser fonte de força e beleza. O projeto é um convite para que as mulheres possam reconhecer suas dores, reconstruírem-se com dignidade e encontrarem na arte um espaço seguro de expressão e cura", afirmou Pietra Borges.

Para o secretário de Cultura e Turismo de Americana, Vinicius Ghizini, a proposta reforça a importância da arte como meio de reconstrução individual e comunitária. "Os projetos financiados pela PNAB e selecionados por meio de chamamento público promovido pela administração Chico Sardelli demonstram como a cultura pode acolher, transformar e dar voz às histórias pessoais que são, ao mesmo tempo, experiências coletivas", destacou o secretário.

"Projetos como o Kintsugi oferecem um cuidado que vai além do tratamento clínico. Acreditamos que a saúde integral da mulher passa também pelo acolhimento emocional e pela valorização da sua história. Ver nossas pacientes se expressando por meio da arte, reconstruindo sua autoestima e encontrando apoio mútuo, é algo profundamente transformador", destacou Raquel Cordeiro, coordenadora da Unacon de Americana.

EXPOSIÇÃO

As obras produzidas ao longo das oficinas serão reunidas em uma exposição no Museu de Arte Contemporânea (MAC) de Americana, ao final do projeto. A mostra pretende ser um espaço de celebração da trajetória das participantes, revelando a beleza da reconstrução e da partilha.

O projeto cultural é realizado pela Prefeitura e Governo Federal, por meio do Ministério da Cultura, e foi selecionado através do edital de chamamento público PNAB 05/2024, nos termos da Lei Federal Nº 14.399/2022 - Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura, com o apoio do Conselho Municipal de Cultura e produção de Pietra Borges.

A Unacon é administrada pelo Grupo Chavantes, por meio de gestão compartilhada com a Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura de Americana. (Por Beatriz Costa, com colaboração de Ariel Ferreira)


Kintsugi a milenar arte de ressignificar os objetos


O Kintsugi ("emenda de ouro" em tradução livre), também conhecido como Kintsukuroi ("reparo com ouro"[1]) é a arte japonesa de reparar uma cerâmica quebrada utilizando laca espanada ou misturada com pó d e ouro, prata ou platina. 

Objetos laqueados são uma tradição de longa data no Japão. Uma teoria é que o kintsugi pode ter se originado quando o shogun japonês Ashikaga Yoshimasa enviou uma tigela de chá chinesa danificada de volta à China para reparos no final do século XV. Quando foi devolvida, o reparo consistia de feios grampos de metal aparentes, então ele solicitou aos artesãos japoneses para procurarem um meio mais estético de reparação. Os colecionadores gostaram tanto da nova arte que alguns foram acusados de deliberadamente esmagar cerâmicas valiosas para que pudessem ser reparadas com as costuras de ouro kintsugi. O kintsugi logo se associou aos vasos cerâmicos usados no chanoyu (cerimônia de chá japonesa). Enquanto o processo é atribuído aos artesãos japoneses, a técnica foi aplicada a peças de cerâmica de outras origens, incluindo a China, o Vietnã e a Coreia.


FILOSOFIA

Como uma filosofia, kintsugi pode ter semelhanças com a filosofia japonesa chamada wabi-sabi, que propõe a aceitação do imperfeito ou defeituoso. A estética japonesa valoriza as marcas de desgaste pelo uso de um objeto. Isso pode ser visto como uma razão para manter um objeto mesmo depois de ter quebrado e como uma justificação do próprio kintsugi, destacando as rachaduras e reparos como simplesmente um evento na vida do objeto, em vez de permitir que o seu serviço termine no momento de seu dano ou ruptura. Assim, kintsugi pode se relacionar com a filosofia japonesa de "não importância" que engloba os conceitos de não-apego, aceitação da mudança e destino como aspectos da vida humana. 

A psicóloga, professora e escritora Anna Patrícia, autora, entre outros, dos livros “Maria Madalena: o feminino na luz e na sombra” e “Corpo: prazer, dor e luz”, ambos voltados para questões femininas, e que desde 2003 conduz Círculos de Mulheres Terapêuticos, é uma entusiasta da prática kintsugi. “Essa arte nos ensina a ressignificar nossas imperfeições e a lidar com nossos problemas com resiliência. Costumo dizer que aquilo que nos quebrou em pedacinhos é, também, o que nos levou adiante, e que quando transformamos e ressignificamos essas dores em algo melhor, em arte, nós nos curamos.”
 Para Anna, todo processo de reconstrução é uma “oportunidade, uma chance de aprendermos que as rachaduras e falhas não são algo a ser escondido, mas sim integrado em nossa alma”.

Enfim, para quem o utiliza o kintsugi é uma forma poética de reciclagem criativa. Não é apenas o conserto de uma peça, mas a maneira de dar uma nova vida e um novo significado a ela. Esse processo de reparo cuidadoso e embelezador vai na contramão da cultura do descartável, incentivando um vínculo mais profundo com os objetos e uma abordagem mais sustentável no dia a dia.

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